Ao final da tarde de terça-feira o cenário nas lojas de Braga dos supermercados das grandes cadeias de venda a retalho não diferia: prateleiras vazias ou, num quadro menos dramático, praticamente despejadas de produtos não perecíveis, sobretudo enlatados.
As lojas de S. Victor e do centro da cidade de duas cadeias de supermercados diferentes visitadas pelo PressMinho recompunham ainda ao final da manhã desta quarta-feira os stoks de conserva, congelados e leite.
Em S. Victor, o gerente de loja reconhece que a afluência “apanhou-nos um bocado de surpresa”. O colega do centro da cidade diz que “há alguns dias que se notava, e bem, o aumento das vendas dos enlatados e de leite, mas ontem [segunda-feira] foi demais”.
Ambos ressalvam que não se tratou de uma “corrida” ao super: “as pessoas estão confiantes que o abastecimento de produtos alimentares vai continuar dentro da normalidade”.
Mas foi um “aviso” para o que pode acontecer se a epidemia não der mostras de abrandar.
Este ‘aquecimento’ para uma eventual correria às prateleiras “começou logo que se soube do encerramento da Universidade [do Minho]”.
E depois “foram as medidas implacáveis do governo para conter [o Covid-19]. As pessoas começaram a preparar-se para ficar 15 dias em casa de quarentena”, diz o gerente do centro. Em S. Victor, o colega da concorrência, subscreve. “Sentimos na loja que os nossos clientes mostravam alguma preocupação, mas com as medidas radicais da Marta Temido [ministra da Saúde], as pessoas começaram a preocupar-se muito mais. Começaram a prevenir-se”.
“Mas não há alarmismo”, garantem os dois.
Os hábitos dos clientes mudaram, e de forma “surpreende”, dizem. O movimento ao longo do dia deixou de ter os ‘picos’ da hora de almoço e do final do dia. “O movimento agora é grande e contínuo”.
Admitem que as rupturas nas conservas, podem tornar a repetir-se, e estenderem-se também aos congelados e leite. “Se a procura continuar assim é provável, sim”. Asseguram, no entanto, que “tudo” voltará à normalidade “até ao meio ou fim da manhã do dia seguinte”.
“Não há motivo para alarmismo”, frisam.
VERGONHA E AÇAMBARCAMENTO
Não são só os hábitos de compra que mudaram. Também a atitude perante a próprio compra. A merecer, provavelmente, “um estudo psicológico”, diz com um ar muito sério o gerente do centro da cidade.
E passa a explicar. “Tenho reparado que alguns clientes vêm aqui uma, duas e três vezes fazer compras. Claro que pensei que estavam a açambarcar ‘às escondidas’, mas não. Uma funcionária da caixa explicou-me que tinham vergonha em mostrar receio ao coronavírus. Estranho, não é?”.
Questionado sobre este tipo não catalogado de heroísmo receoso, o gerente de S. Victor ri-se. Também já assistiu “inúmeras” vezes ao fenómeno
“Acho que têm é medo de passar por açambarcadores e ouvir algum comentário desagradável”, diz, para de seguida alertar: “anda para aí muita gente a açambarcar, é verdade, mas não é para ter em casa. É para depois vender a preços exorbitantes nos mini-mercados de bairro”.
“O povo não tem dinheiro para açambarcar”, atira.
Esta terça-feira, aAssociação Portuguesa de Empresas e Distribuição (APED) confirmava um “ligeiro aumento da procura”, mas garante que tudo se mantém em “total normalidade”