A Universidade de Berkeley, nos EUA, usou inteligência artificial (IA) para criar um dispositivo que permitiu uma mulher tetraplégica “falar” pela primeira vez em 18 anos.
O dispositivo dos investigadores consiste num mecanismo que consegue traduzir a atividade cerebral da fala em palavras quase em tempo real, segundo as conclusões do estudo “Nature Neuroscience”.
Este resolveu a latência neuroprotética da fala, sendo o intervalo entre o momento em que uma pessoa tenta falar e quando o som é produzido.
Os últimos avanços da IA permitiram os cientistas desenvolverem uma transmissão capaz de sintetizar os sinais de cérebro em discurso falado.
«A nossa abordagem traz as mesmas capacidades de descodificação rápida de voz de dispositivos como Alexa e Siri para neuropróteses», diz Gopala Anumanchipalli, um dos investigadores.
Os dados neurais puderam ser traduzidos e codificados, permitindo a transmissão de voz quase ao mesmo tempo.
«O resultado é uma síntese de fala mais natural e fluida», acrescenta.
Edward Chang, outro dos investigadores da equipa de Berkeley, assegura que a tecnologia «tem um enorme potencial».
«É entusiasmante que os últimos avanços na IA estejam a acelerar muito as interfaces cérebro-computador para utilização prática no mundo real num futuro próximo», diz.
Para o ensaio clínico, os cientistas colocaram a interface cérebro-computador numa mulher de 47 anos que vive com tetraplegia, paralisia dos membros e do tronco, impedindo-a de falar há 18 anos, depois de um AVC (acidente vascular cerebral).
A mulher foi instruída a olhar para um ecrã que dizia “Olá, como estás?”, sendo encorajada a pronunciar a frase silenciosamente. Com este exercício, os investigadores treinaram o seu algoritmo, usando a atividade cerebral da mulher, registada por elétrodos implantados no seu córtex motor da fala.
A mesma pronunciou internamente cerca de 1.024 palavras únicas. O modelo foi usado para descodificar o discurso online, com a intenção vocal da participante e, ainda, para produzir áudio imitando a sua voz, usando um clip da mulher a falar antes da lesão.
Cheol Jun Cho, outro autor do artigo, explica que a neuroprótese funciona através da recolha de amostras de dados do córtex motor, a parte do cérebro responsável pela fala e, depois, usa IA para descodificar e transformar em discurso audível.
Num estudo anterior, havia uma longa latência de descodificação de cerca de oito segundos para uma única frase. Agora, a fala é quase em tempo geral, enquanto a pessoa tenta falar, aponta a Escola de Engenharia da Universidade da Califórnia, em Berkeley.
Fotos: Noah Berger/UCSF