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Santiago de Compostela. “Braga é de vital importância no Caminho da Geira”

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Há três anos a Associação Jacobeia do Caminho Minhoto Ribeiro (AJCMR) apresentou em Braga o traçado do Caminho da Geira, coincidente, na sua quase totalidade, com o que foi oficializado em Março de 2019 pela Igreja. Abdón Fernández, presidente, realça nesta entrevista o papel da componente portuguesa e das associações envolvidas neste projecto e fala do ‘falhanço’ das negociações de geminação de Berán com Caldelas, em Amares.

O caminho Braga-Santiago tem duas propostas de traçado (Geira e dos Arrieiros e o dos concelhos). Qual defende a AJCMR?

A nossa intenção não é diabolizar, nem prejudicar o projecto ou o objectivo global. As diferenças resultam da forma como se interpretam os dados históricos que abarcam os traçados dos caminhos de peregrinos. As duas propostas são fruto do trabalho iniciado com a fundação da AJCMR, em 2009, ainda que chegando a conclusões muito diferentes. No entanto, não devendo haver dúvidas sobre a história, quem detém o poder possui, muitas vezes, os meios para impor a sua versão.

Mas o Caminho da Geira e dos Arrieiros foi reconhecido pela Igreja.

O Caminho da Geira oficializado pela Igreja é o resultado do trabalho voluntário e desinteressado da AJCMR e, posteriormente, da Associação Codeseda Viva; com o objectivo de valorizar a história, o património e impulsionar a economia ao longo do seu traçado. No caso do outro traçado [proposto pela associação de concelhos], os políticos usaram o seu poder, incluindo económico, para custear a sua elaboração, feito à medida dos seus interesses, nalguns casos em desrespeito pela história, e esta é uma das diferenças fundamentais entre os dois projectos.

O traçado da Associação Codeseda Viva e da AJCMR coincidem?

Perante as propostas apresentadas e os interesses dos peregrinos, que são quem faz viver o caminho, sem duvida que a proposta revelada em Braga a 1 de Abril de 2017 (e em Fevereiro anterior em Ribadavia) pela AJCMR é genericamente coincidente com a da Associação Codeseda Viva, reunindo na sua passagem por O Ribeiro elementos singulares que caracterizam este caminho – o património cultural e edificado, as termas e o vinho. É uma realidade muito próxima à época das peregrinações. Já a proposta dos concelhos mescla distintas variantes, não é tão rica naqueles aspectos e passa até por locais que não existiam na Idade Média, como Leiro.

Qual a importância que atribui à parte portuguesa deste caminho?

A importância da parte portuguesa é vital. É a mais importante, não vou escamotear esta questão. Basta o facto do caminho começar na Sé de Braga. Realço a importância histórica de Braga em relação à peregrinação a Santiago de Compostela, a capitalidade espiritual ibérica em que Braga desempenhou um dos papéis mais importantes e as relações históricas e religiosas entre Braga e Santiago de Compostela. Além da importância ao nível do romano, mais antigo que o próprio fenómeno jacobeu.

Mais que não fosse pela existência da geira romana, é de vital importância neste projecto. É o que faz dele único, seja a nível nacional ou internacional. É uma singularidade se o compararmos com todos os caminhos de peregrinação. É um fenómeno transfronteiriço, que enriquece as duas regiões.

A geira e as termas são símbolos deste caminho?

Os vínculos deste caminho com Portugal são fundamentais para a nossa associação, nomeadamente no que se refere à geira romana, que é um património romano fundamental, essencial para que seja um traçado único devido a esta referência tão antiga. Por outro lado, de facto, abundam as termas, comuns a ambos os países, daí que não haja explicação para haver quem queira que não passe em Berán. Para além, claro, do comércio do vinho e das peregrinações religiosas. E constitui-se também como uma linha de ligação entre Portugal e a Galiza, muito interessante a diferentes níveis, por exemplo termais, o que também evidencia a  sua singularidade.

As autoridades e associações portuguesas têm colaborado?

Eu não tenho razões de queixa. Por exemplo, a Associação Espaço Jacobeus tem-nos dado um apoio incondicional e estou muito orgulhoso em ter conhecido muitos dos seus elementos. É um grande exemplo para mim e a seguir. Em relação às autoridades políticas também tenho boas referências, nomeadamente em relação às câmaras de Braga ou Amares – aqui através de Caldelas, onde já há um albergue, uma iniciativa que louvamos e apoiamos.

Como analisa o facto do concelho de Leiro não ter aprovado a proposta de abertura de negociações de geminação de Berán com Caldelas, concelho de Amares?

Os interesses que prevaleceram não foram os da promoção dos interesses das populações e deste itinerário. Seria uma forma de promover as termas de Berán e aproximar as relações com Portugal, através de Caldelas e Amares. Haverá razões políticas e de incapacidade pessoal que levaram à decisão de não haver esta geminação, que seria muito importante dos pontos de vista social, cultural e económico.

A Igreja certificou proposta da Associação Codeseda Viva. É a que defende?

A proposta da Associação Codeseda Viva é praticamente coincidente com a que apresentamos em 2017 em Ribadavia [Galiza] e Braga e concordamos com ela, embora admitamos uma variante na zona de O Ribeiro pela margem esquerda do rio Avia, ligando à Via da Prata. No entanto, a associação dos concelhos tem um poder político muito grande para pressionar e fazer valer a sua proposta, independentemente da fundamentação histórica. Tenho algum receio em relação ao que possa acontecer. A minha esperança é que se mantenha um traçado próximo do actual Caminho da Geira, mesmo que depois sejam aprovadas variantes que não desvirtuem o projecto.

Concorda que haja uma variante em A Estrada?

A proposta da Associação Codeseda Viva está suficientemente documentada e não impede que se possa estabelecer uma variante [pela Via da Prata ou por Pontevedra/Ramalhosa]. Esta solução é perfeitamente viável em minha opinião.

Por que é que é fundamental que o caminho passe por Berán (Galiza)?

Como Leiro não existia na Idade Média, a nossa proposta é que o traçado depois de Beade siga por Berán, junto às termas, seguindo por Caldas até Lebosende e Pazos de Arenteiro. As razões para que o caminho passe por Berán assentam fundamentalmente na história. Além disso, se este caminho é singular pela sua riqueza termal, não faz sentido ser de outra maneira. Por outro lado, Berán era um enclave pelo qual entrava em O Ribeiro quem vinha de Santiago de Compostela para negociar o vinho.

Hoje, por estar a 103 quilómetros de Santiago, é um ponto de partida a pé a considerar na atribuição da Compostela.

E que pensa a AJCMR fazer para garantir a passagem por Berán?

O que continuaremos a fazer é procurar mais documentos que sejam irrefutáveis e provem a passagem por Berán de peregrinos e caminhos de comércio. Estamos a tentar promover a cultura jacobeia e demonstrar que Berán era um ponto de referência na época medieval. E também estamos a tentar fazer um albergue de peregrinos. No sábado, dia 14, promovemos o encontro “O Caminho da Geira Minhoto Ribeiro”, em Berán, pelas 19 horas, para apresentar o traçado, descrever as diferenças entre a nossa e outras propostas, e analisar a repercussão sócio-económica do caminho para Berán.

Será possível haver também em Leiro uma variante (por Berán ou por Leiro)?

A nossa associação tentou reunir com as associações e entidades no sentido de estabelecer um traçado comum ou com uma variante no núcleo central da comarca de O Ribeiro, com base em razões históricas fundamentadas. Tal não foi possível, daí cada um [associações e grupo de concelhos] ter apresentado a sua proposta, o que de alguma forma está a confundir os peregrinos.

Ao fim destes 11 anos a lutar por este caminho, valeu a pena o trabalho da AJCMR?

Sim, valeu a pena. O papel da AJCMR neste projecto é indesmentível. Basta analisar a história destes anos. E além disso, não haverá marcha-atrás, o caminho é uma realidade e muito próxima do traçado que apresentámos em 2017. Por um lado, receio que o pior dia esteja para vir, se não for reconhecido o nosso trabalho, mas, ao mesmo tempo, espero a chegada de um momento de alegria. Até agora, a maior alegria foi ver os primeiros peregrinos a chegar a Berán [em maio de 2017], bem como o dia de apresentação em Braga no dia 1 de abril de 2017. A maior esperança que mantenho é que os peregrinos continuem a fazer o caminho actual, porque o caminho é deles e são eles quem o faz. É um caminho que inevitavelmente será reconhecido pelas autoridades.

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