Mulheres, pessoas com baixos rendimentos e com escolaridade baixa são quem mais aposta em “raspadinhas”, um “vício” que atinge cerca de 100 mil adultos em Portugal, dos quais cerca de 30 mil apresentam perturbação de jogo patológico.
O retrato é traçado no estudo nacional “Quem paga a raspadinha?”, realizado pela Universidade do Minho para o Conselho Económico e Social (CES), que foi divulgado esta terça-feira em Lisboa no evento “Apresentação dos resultados da 1ª fase do Projeto de Investigação – Quem paga a raspadinha?”
Segundo o estudo, que validou 2.554 entrevistas, “o consumo frequente de raspadinhas é mais comum nas pessoas com baixos rendimentos”, precisando que é três vezes mais frequente numa pessoa com rendimentos entre os 400 e os 664 euros por mês do que nas pessoas com mais de 1.500 mensais.
A aposta neste jogo também é mais comum nas pessoas com ensino básico e secundário (5.8 e 3.9 vezes maior probabilidade do que as pessoas com mestrado/doutoramento).
Outra das conclusões do estudo nacional aponta que são as mulheres (53,15%) quem apresenta mais problemas com o jogo, contra 46,85% dos homens.
Dos 221 inquiridos que dizem jogar regularmente, 112 (51%) afirmaram que jogam semanalmente, 91 (41%) mensalmente e 18 (8%) diariamente.
A investigação conclui que 3,09% dos adultos estão em risco de desenvolver problemas de jogo e estima que esses problemas possam afetar 1,21% da população adulta.
Contactado pela agência Lusa, o psicólogo e coordenador do Instituto de Apoio ao Jogador, Pedro Hubert, admitiu que o instituto recebe pessoas com problemas relacionados com a raspadinha.
“Só não recebemos mais em grande parte porque, sendo um instituto particular e privado, muitas vezes as pessoas não têm capacidade financeira para pagar” os tratamentos.
O técnico de aconselhamento em adições na área do jogo patológico referiu que, tal como diz o estudo, quem mais aposta na lotaria instantânea (raspadinha) da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa “são pessoas com menos capacidades económicas, muitas vezes com maior idade, menores estudos e muitas vezes com problemas de ansiedade ou depressão associados”.
Observando que a raspadinha “está muito implementada do ponto de vista cultural, social”, com as pessoas a jogarem e a oferecerem raspadinhas, devia haver mais informação no sentido de prevenir comportamentos de adição.
A prevenção, defendeu, “passa essencialmente por muita informação, que deve passar, não só nos locais de jogo, mas também na televisão”, com a mensagem de que “o jogo é algo recreativo e não para investimento”: “É para a pessoa se divertir, não é para ajudar a aumentar a reforma ou para pagar a renda da casa ou para ter mais algum dinheiro”.
Muitas pessoas jogam porque pensam que vão conseguir ganhar dinheiro e, quando perdem o que ganharam, vão querer recuperar o dinheiro, explicou o especialista.
Pedro Hubert alerta que há vários fatores que elevam o potencial de risco da raspadinha, nomeadamente para quem tem uma certa predisposição para a adição: o facto de se poder comprar e apostar “muitas vezes num minuto” na raspadinha, a par da acessibilidade, da disponibilidade, do preço baixo e dos prémios elevados.
O risco é também maior para “as pessoas que têm mais dificuldades ou que têm menos noção do que é a estatística e de que o jogo está mais a favor da casa do que das pessoas que compram”.