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OPINIÃO

OPINIÃO -
Amor e Traição

Texto de Hélder Araújo Neto (Psicólogo Clínico)

Tive um amigo que morreu por causa do amor. Descobriu que a companheira o traía, e suicidou-se. Não aguentou a perda, perdeu a mulher e as filhas, que eram a sua razão de viver. Infelizmente, não conseguiu lidar, não pediu ajuda.

Porque é que as pessoas traem?

A traição, por definição, é a quebra da confiança entre as duas partes. No contexto amoroso, que é o foco deste texto, a confiança carrega um peso ainda maior, pois toca diretamente na vulnerabilidade e na intimidade compartilhada. As razões para a traição variam. A insatisfação emocional, a monotonia no relacionamento e a busca por validação externa, quando ela não existe no seio do casal, são algumas das principais motivações.

Descobrir uma traição pode ser devastador; rasga as entranhas, dilacera. A confiança, construída ao longo do tempo, pode desmoronar em segundos. Esta é a pergunta que se impõe: é possível perdoar e reconstruir?

Da minha perspetiva, pela minha experiência em terapia de casal, embora desafiador, o perdão é possível, mas muito raro. O processo exige que ambas as partes estejam dispostas a entender as causas do ocorrido, reconstruir a comunicação e estabelecer limites claros para o futuro. Para alguns, a traição pode até servir como um ponto de viragem, permitindo que o casal renove os seus votos de conexão e cumplicidade.

Por outro lado, para muitas pessoas, a traição marca o fim de uma história, especialmente quando a confiança não pode ser restaurada. Encerrar um ciclo pode ser um ato de amor-próprio, amor esse que deveria ser o principal, para que não se dependa emocionalmente de ninguém.

Numa nota à parte, existe quase uma justiça divina, porque as pessoas que iniciam um relacionamento na traição, muito provavelmente serão traídas. Uma vez que, na maioria das vezes, o traidor voltará a trair, faz parte do seu caráter.

O amor é uma força poderosa. Ele une, constrói e transforma. É parceria, respeito e comprometimento. É a escolha diária de estar presente para o outro, mesmo diante dos desafios da vida. Apesar do amor romântico, poder ser considerado uma construção social, ele está profundamente enraizado na nossa biologia, ativando áreas do cérebro ligadas ao prazer e à recompensa.

O amor é o combustível de poemas, músicas e filmes que tentam capturar a sua essência inatingível. Contudo, esse outro elemento poderoso, a traição, também inspira a arte, por exemplo, na literatura, retratada em obras clássicas como Madame Bovary, de Gustave Flaubert, ou então, Anna Karenina, de Liev Tolstói.

Para terminar, uso aqui uma metáfora. Imagine, caro leitor, que é mordido por uma serpente, e em vez de se focar em tratar-se, salvar-se, retirando o veneno do corpo, corre atrás da serpente para perceber porque é que ela o mordeu, para lhe dizer que não merecia ser mordido. Faria isso?! Suponho que não. Deixo aqui a minha sugestão. Se esta tragédia lhe acontecer, concentre-se na cura, em sarar a ferida, no desenvolvimento do amor-próprio, na sua reconstrução. Sairá do processo mais sábio, porque, tragicamente, é no sofrimento que crescemos mais.

P.S. Este texto é dedicado ao Paulo. Paz à sua alma.

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