O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) assegurou esta segunda-feira que a acção da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos no seio da Igreja não é uma “caça às bruxas”, nem uma “campanha contra ninguém”.
Ao intervir na sessão de abertura do 10.º Simpósio do Clero, que começou esta segunda-feira em Fátima, José Ornelas defendeu que “a verdade é libertadora para todos. O segredo não deve servir para guardar e sigilar coisas nefandas”.
Assumindo que o reconhecimento da existência de casos abuso sexual de menores e de pessoas vulneráveis por membros do clero “é doloroso” e enche a Igreja “de vergonha e pesar”, o também bispo de Leiria-Fátima, disse que “tentar esconder esta realidade, para além de contrariar os princípios elementares da justiça para com as vítimas e impedir o seu necessário tratamento, não ajuda ao esforço de erradicação destes males”.
José Ornelas sublinhou ainda que a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa, coordenada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, foi criada no sentido da obtenção de “clareza e purificação”.
“Não se trata de nenhuma ‘caça às bruxas’ nem de uma campanha contra ninguém, mas de um caminho necessário de identificação de males que existiram e continuam presentes, para que possamos assumi-los na sua realidade dolorosa, como processo de conversão e de libertação para todos”, disse o presidente da CEP, para quem, “dar atenção às vítimas e escutá-las é o primeiro passo de um processo de libertação, de justiça e de dignidade”.
Segundo José Ornelas, cada um dos abusos, “pelo mal que causa às pessoas e à comunidade (…) é também um sofrimento e uma derrota para toda a Igreja”.
“Por isso, não pode haver tolerância nem encobrimento de casos destes. Impõe-se um caminho claro no interior da Igreja e uma colaboração com as autoridades competentes para averiguar quaisquer ocorrências, segundo os processos legais do país, com as medidas legais e penais previstas na Igreja e no ordenamento jurídico civil”, afirmou, perante uma assembleia composta por muitos bispos e centenas de padres, diáconos e seminaristas.
O presidente da CEP, já em declarações aos jornalistas, refutou a ideia de uma “Igreja pedófila” e, confrontado com algumas críticas à alegada inexistência de apoio do episcopado ao cardeal patriarca Manuel Clemente, a propósito do possível encobrimento de casos na zona de Lisboa, José Ornelas assegurou que esse apoio e solidariedade foram dados, quer “colectivamente, quer de forma individual”.
Por seu turno, o presidente da Comissão Episcopal das Vocações e Ministérios, António Augusto Azevedo, alertou que a “conduta lamentável e criminosa de alguns clérigos não legitima que se instale um manto de suspeição sobre todos”.
“A esmagadora maioria dos padres merece crédito e reconhecimento pelo seu trabalho ao serviço do povo de Deus”, disse o também bispo de Vila Real, para quem, perante um “estado de espírito que é de tristeza, dor e vergonha”, se impõe “mudar a atitude: de uma cultura que negou ou desvalorizou o problema para uma atitude nova, preocupada em conhecer a sua real dimensão, perceber as suas causas e avaliar assoas consequências pessoais e comunitárias”.
Segundo o prelado, “nesta crise não estão em causa os valores e princípios da Igreja, porque estes assentam no Evangelho. Em causa está a infidelidade a esses princípios”.
António Augusto Azevedo pediu, também, que este problema não crie “divisões entre o clero”, advogando que, “em vez de intriga e maledicência, é indispensável (…) reforçar a comunhão, a unidade e a fraternidade dos presbitérios”.
Com vista a contribuir para a prevenção de futuros casos, a Comissão Episcopal de Vocações e Ministérios entregou já à CEP um projecto de novas orientações para a formação sacerdotal, que será apreciado em Assembleia Plenária do Episcopado. Estas novas orientações visam, nomeadamente, reforçar “os critérios de admissão” nos seminários e a “preparar melhor os futuros padres em todas as dimensões”.
Com MadreMedia