Por Hélder Araújo Neto
Psicólogo
O artigo deste mês debruça-se sobre as redes sociais. Foi inspirado por uma notícia que li, na qual Britney Spears (cantora “pop”) confessa, na conta do Instagram, para cerca de 42,1 milhões de seguidores, “tudo parece perfeito, mas não podia estar mais longe da realidade”. Esta confissão fez-me refletir sobre o assunto e remeteu-me para pacientes minhas que, como tantas e tantos outros, sofrem as consequências desta realidade virtual.
Oitenta e cinco por cento de todas as fotografias publicadas são editadas. Esta realidade confere um problema porque desenvolve uma autoestima virtual, por oposição a real, sendo que, quanto mais o indivíduo procura equiparar-se a essa vida editada, mais infeliz irá sentir-se na vida real. Até porque a imagem corporal é uma questão importante, sobretudo para os jovens, particularmente entre as mulheres na fase da adolescência, e estes milhões de fotografias, principalmente as publicadas por celebridades (que têm muitos seguidores, logo, muita influência), conduz a uma comparação baseada na aparência. O impacto é tão grande que, para exemplo, verifica-se um aumento da procura, por parte das gerações mais jovens, de cirurgias plásticas para aparecer melhor nas fotografias a publicar. Este cenário é muito pernicioso de “per si”, podendo piorar, tornando-se em vício, em dependência, com as respetivas repercussões.
Há estudos que indicam que as redes sociais têm uma capacidade superior de viciar, tal como acontece com a adição ao tabaco, ou ao álcool, porque, de entre outras razões, o acesso a este “vício” é simples e gratuito. Mas as causas mais reconhecidas desta dependência são a baixa autoestima, sentimentos de vazio, a hiperatividade e, inclusivamente, a falta de afeto, tal como a carência que, muitas vezes, se tenta compensar com os famosos “likes”. De facto, estes “gostos” são procurados, quase compulsivamente, para experimentar uma intensa — mas sempre breve — sensação de satisfação que, no entanto, pode ser contraproducente, porquanto provoca dependência, ao longo do tempo, da opinião dos outros.
O que determina a dependência das redes sociais? O que a categoriza? Existem alguns indícios de que a referida dependência origina ansiedade quando não se tem acesso à Internet, quando a rede social não funciona ou quando está mais lenta do que o habitual, quando se consulta as redes sociais assim que o indivíduo se levanta e se deita, perante o sentimento de inquietação se não tiver o “smartphone” ao alcance da mão, ao caminhar utilizando as redes sociais, perante o sentimento de tristeza se não receber “likes” ou visualizações, quando se prefere a comunicação com amigos e familiares através de redes sociais em lugar de se comunicar pessoalmente, em face da necessidade de compartilhar qualquer coisa da vida diária ou, então, quando se considera que a vida dos outros é melhor do que a sua, em função do que vê nas redes.
Embora, obviamente, não sejam os únicos, atribuo maior enfoque nos adolescentes porque são os que correm um maior risco de cair na dependência, por três motivos fundamentais: tendência para a impulsividade, devido ao córtex pré-frontal, responsável pelo controlo dos impulsos, pelo controlo das emoções, pela capacidade de planear e pelo adiamento da gratificação, ainda não estar totalmente desenvolvido (é a última fase do cérebro a ganhar maturidade, que acontece por volta dos 25 anos); necessidade de terem influência social ampla; e, finalmente, a necessidade de afirmar e reafirmar a identidade de grupo.
Para terminar, deixando uma nota otimista, não quero de deixar de salientar que as redes sociais também têm aspetos positivos, tal como o fenómeno do hashtag #MeToo, que reuniu histórias de assédio e abuso sexual que muitas mulheres foram mantendo em segredo por longos anos, movimento este que facilitou a libertação de sofrimento, originando a aplicação da justiça.