Texto de Fabíola Lopes
Tonito caminhava entre verdes e miragens
todos os dias numa conquista diferente.
A professora exigia verbos, contas e História
e o rapaz enredava-se em paisagens.
Nessa dança de intenções
nada ficava por fazer.
Tonito cumpria as obrigações
com distinção e alto prazer.
Sério, tímido e inseguro,
com sedes por acontecer,
o seu olhar era puro,
com mãe Deolinda a acolher.
Mãe-terra, mãe-ninho, mãe-colo,
a saúde dos filhos fez prevalecer.
Sacrifícios enchem os rosários,
não foram tantos os que ficaram por ocorrer.
Ansias de estradas, de cores e horizontes,
recheadas pelas partilhas dos irmãos distantes.
Entre Fiscal e Lisboa foram muitas as pontes
que alimentaram sonhos radiantes.
Ainda experimentou trabalhos
forçados contra o desejo
crescente e sem atalhos
de respirar à beira Tejo.
Aos 11 anos, de mala aviada,
vai Tonito de alma alada.
A pequena aldeia que o viu florescer
acena-lhe a miragem de adolescer.
De trabalho em trabalho, cresce a confiança, a andança e a vontade.
Homem limpo, disciplinado e honesto, que ao povo encanta na sua jornada
unária.
Procura saciar a sede
de diferente, de maior, de música.
Sempre música num António que
vai de Londres a Amesterdão
para vir para Lisboa e abrir um salão.
É o barbeiro que todos querem e que passa pelas melhores casas
até abrir a sua, única e esplendorosa,
a que cria como quer, numa afirmação de saber e vontade,
gosto e caridade.
Nesta jornada tão esfaimada,
de cores, de seres, de amores e música,
as melodias pulsam desejos, rufam tambores, perfeições a amanhecer.
Convívios, partilhas e crescimentos,
aprendizagens vertiginosas num sopro de vida,
uma firmeza esbaforida, uma sede por acalmar,
o tempo que escorre as existências, numa luta desigual.
Variações a variar, a criar, a inovar:
Minho, Rock e Fado, com o folclore a festejar
esta voz sem quadratura,
este ser sem formatura.
Livre como a água, o vento, o raio e o trovão.
Livre como se quer a vida vivida
antes, muito antes, de se conseguir compreender
o turbilhão que nos deixou marcas de identidade,
de portugalidade,
de uma interioridade que carregamos sem quê nem porquê.
Variações, aqui, entre nós e o tempo.