Tive o grato prazer de assistir à antestreia do filme “Variações”, no Parque das Termas, na Vila de Caldelas, num momento que em minha opinião representou a primeira e única homenagem digna da sua dimensão, na nossa terra.
Na verdade, a genialidade, o talento percursor, a visão vanguardista e, principalmente, o enorme legado deixado pelo António à cultura musical portuguesa têm sido mais reconhecidos entre comuns cidadãos, do que propriamente pelas instituições.
Parece haver uma espécie de preconceito sombrio, ou de minimização invejosa que leva alguns a querer secretamente diminuir um homem proveniente de uma família de parcos recursos, que não sabia música, mas foi capaz de a transformar com o seu “Toque de Midas”.
Quanto ao filme, sei que divide opiniões, mas a verdade é que não deixou ninguém indiferente. Quem conhecia Variações esperava um filme que focasse a genialidade musical de uma artista ímpar, um artista que cantarolasse “O Corpo é que paga”, ou outras das sua popularizadas e imortais canções. Mas não…
Os que não conheciam Variações, nomeadamente os mais novos, fizeram o exercício despidos deste conhecimento e puderam conhecer um homem firme, que lutou desalmadamente por uma crença quase irracional: a sua “estranha” música.
Um homem que defendeu de cabeça levantada as suas escolhas, o seu caminho profissional, a sua orientação. Um homem que nas suas travessias pelo mundo, manteve o seu coração em Amares, na ligação umbilical a Deolinda de Jesus. É maravilhosa a passagem em que atende o telefone para uma triste notícia, no seu tom peculiar: “Oh minha Mãe!”
Variações viveu uma história digna de um filme – e isto tem estado na sombra do mediatismo da sua música. O filme foca a sua eterna história de amor, a sua garra quase incoerente, a sua teimosia em afirmar-se “barbeiro” e não “cabeleireiro”, a sua humildade excêntrica, a sua fragilidade emocional escondida.
Curioso, porque a sua glória quase não se conta neste filme. Está implícita na memória de todos!
Pena que não o tivéssemos vivido mais. Pena que Amares não o tenha recebido em vida já vingado. Pena que os tempos não lhe tenham sido justos, nomeadamente na nossa terra, aquela que o viu nascer.
Amares tem a obrigação de o homenagear. Em honra àquele homem e a Deolinda de Jesus, devemos ostentar orgulhosamente a sua marca, mesmo que pouco se tenha feito por ele.
Quanto a “surfar” o onda da sua aura, em benefício próprio, isso é coisa de gente “fraca”. E desses nunca se fará um filme!